sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Os Sertões- Euclides da Cunha

A obra mais famosa de Euclides da Cunha, Os Sertões, que trata da Guerra de Canudos, é na verdade, formado por três livros: A Terra, O Homem, A Luta. Seu autor era republicano, abolicionista, cursou engenharia e freqüentou a Escola Militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. Educado no pensamento positivista, tendo Benjamim Constant como mestre, discípulo da filosofia de Auguste Comte, influenciado pelos ensinamentos de Darwin em “A Evolução das Espécies”, elabora sua obra acatando não só o pensamento linear evolucionista em voga na Europa nos fins do século dezenove, como também os preceitos morais a respeito das raças, onde atribui ao mestiço a alcunha de desequilibrado, raça inferior e considera a mistura de raças diversas, prejudicial. Talvez por isso, seja considerado por alguns literatos como uma obra datada, fruto de uma realidade que só existiu num determinado momento histórico. Seu sertanejo é dicotômico. Segundo Alfredo Bosi, responsável pela apresentação da obra, considera que seus personagens são por um lado valente, por outro supersticioso. Se é generoso, é fanático. Entre outras comparações, que acabam por formar a base para o entendimento do que ocorreu em Canudos, busca compreender o que se passa no pensamento do homem sertanejo, compreender seu messianismo, suas crenças, analisar seus aspectos psicológicos, mas sempre de acordo com a ideologia vigente de seu tempo, o que confere á obra um cunho didático, principalmente ao tentar explicar a dureza do homem sertanejo em paralelo com a descrição do ambiente árido em que vive e que acaba por moldar-lhe o caráter. Por isso, seu livro é dividido em três partes. O autor vincula sua compreensão ao entendimento de sua infra-estrutura geológica, que relata com os pormenores de um cartógrafo, passando pelos acidentes do solo, variações climáticas e finalmente a flora e fauna. Como último elo, nos apresenta seu rude homem. Só então, o autor considera-nos apto à leitura da última parte, que trata exclusivamente da Guerra de Canudos. Trata-se, ainda, de uma obra de cunho histórico, pois seu autor esteve lá, presente no palco dos acontecimentos, como jornalista, até o dia da rendição. As narrativas, portanto, são verdadeiros relatos do massacre que ocorreu. “(...) As infelizes, em andrajos, camisas entre cujas tiras esfiapadas se repastavam olhares insaciáveis, entraram pelo largo, mal conduzindo pelo braço os filhos pequeninos, arrastados”. Eram como animais raros num divertimento da feira. Em volta cruzavam-se, em todos os tons, comentários de toda a sorte, num burburinho de vozes golpeadas de interjeições vivíssimas de espanto. O agrupamento miserando foi por algum tempo um derivativo, uma variante feliz aligeirando as horas enfadonhas do acampamento. Mas acirrou a curiosidade geral, sem abalar os corações. Um dos pequenos -franzino e cambaleante- trazia à cabeça ,ocultando-a inteiramente porque descia até aos ombros, um velho quepe reúno apanhado no caminho. O quepe, largo e grande demais, oscilava grotescamente a cada passo, sobre o busto esmirrado que ele encobria por um terço. E alguns espectadores tiveram a coragem singular de rir. A criança alçou o rosto, procurando vê-los. Os risos extinguiram-se: a boca era uma chaga aberta de lado a lado por um tiro!” Observa-se no último capítulo, denominado “Últimos Dias”, a expressão de espanto de Euclides da Cunha, diante daquilo que ele mesmo considerou um erro histórico, uma barbárie. Ele, que lá estava como militar, correspondente de guerra, repórter, encontrou uma realidade muito diferente daquela que se lia nos jornais, na parte “civilizada” do país. Primeiro porque se deu conta de que o inimigo não possuía condições intelectuais para opor-se á república, nem ser dela a favor. Sua condição miserável estava fadada apenas á sobrevivência diária. Embrutecido pelas condições impostas por seu ambiente, o inimigo não defendia causas políticas e sim de caráter religioso, uma vez que Antônio Conselheiro não passava de um líder messiânico. Tal revelação foi para o autor, um verdadeiro divisor de águas em sua forma de compreender a sociedade em que vivia, uma vez que compartilhava da idéia de “uma canudos monarquista articulada com políticos reacionários ou com os revoltosos da Marinha.” Finalmente, ao descrever, de forma comovente e magistral seus relatos, de uma Canudos que não se rendeu, que foi segundo o próprio autor, um exemplo único em toda a História, não esconde sua vergonha diante dos vencidos. Euclides da Cunha consegue, com esta obra, sedimentar na sociedade brasileira, cuja idéia de civilidade vai beber em fontes e exemplos importados da Europa, a idéia de uma realidade brasileira distinta, com a figura do sertanejo embrutecido, forte, sobrevivente. mostra ao povo brasileiro uma de suas muitas faces, que se pretendiam ocultas. Márcia Taube

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Puedo escribir los versos más tristes esta noche

A Noite Estrelada sobre o Rio Reno (Vincent Van Gogh). Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Escribir, por ejemplo:”La noche está estrellada, y tiritan, azules, los astros, a lo lejos”. El viento de La noche gira em el cielo y canta. Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Yo La quise, y a veces ella tambiém me quiso. Em las noches como esta la tuve entre mis brazos. La besé tantas veces bajo el cielo infinito. Ella me quiso, a veces yo también la queria. Cómo no Haber amado sus grandes ojos fijos. Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Pensar que no la tengo. Sentir que la he perdido. Oír la noche inmensa, más inmensa sin ella. Y el verso cae al alma como al pasto el rocio. Qué importa que mi amor no pudiera guadarla. La noche está estrellada y ella no está conmigo. Eso es todo. A lo lejos alguien canto. A lo lejos. Mi alma no se contenta com haberla perdido. Como para acercarla mi mirada La busca. Mi corazón la busca, y ella no está conmigo. La misma noche que hace blanquear los mismos árboles. Nosotros, los de entonces, ya no somos los mismos. Ya no La quiero, eS cierto, pero cuánto la quise. Mi voz buscaba el viento para tocar su oído. De outro. Será de outro. Como antes de mis besos. Su voz, su cuerpo claro. Sus ojos infinitos. Ya no la quiero, es cierto, pero tal vez la quiero. Es tan corto el amor, y tan largo el olvido. Porque em noches como esta la tuve entre mis brazos, Mi alma no se contenta com habela perdido. Aunque este sea el último dolor que ella me causa, Y estos sean los últimos versos que yo le escribo. Pablo Neruda, Santiago, 24-11-1923

Bistrôs Paris- Alex Herzog

Chegou pelo sedex minha encomenda tão esperada: o livro de Alex Herzog “Bistrôs Paris-onde comer bem, bacana e barato”. O autor é formado em administracão, mas tem como hobbie a fotografia e as influências culinárias herdadas da avó belga. Em dado momento da vida, largou um ótimo emprego e partiu para Nova York, para estudar fotografia , além de contribuir com fotos e artigos para uma coluna de gastronomia de um jornal local. Que coragem! Na volta ao Brasil, abriu uma escola de culinária e montou o IN-HOUSE Café-Bistrô, no Rio Design Barra. Deu super certo e agora lança seu livro, que já li em um piscar de olhos, pois é leve, divertido e cheio de dicas legais. Dividido por Arrondissements, que são os correspondentes aos bairros parisienses, ele enumera os locaizinhos que valem a pena conhecer. Os bons bistrôs ou brasseries, onde a comida honesta a preços idem, são referenciados. Todo mundo que viaja para lá sabe que sempre existe a possibilidade de cair no golpe dos restaurantes típicos, só para enganar turistas desavisados, ou então de levar um susto ao se deparar com a conta, em um local que não tem estrela michelin alguma. De quebra, ele fotografa, conta as histórias dos estabelecimentos, e ainda dá dicas de passeios pelos arredores e de filmes em que os locais aparecem ou inspiram! Influenciada por Herzog, me dá uma vontade louca de também chutar o pau-da-barraca, ir para lá sem avisar o paradeiro, me enfiar no La Coupole e pedir um choucroute spéciale, só voltando ao trabalho depois de nove dias. Salute!

terça-feira, 12 de outubro de 2010

A Lenda do El Dorado

Esta foto eu tirei do acervo do Museu do Ouro, em Bogotá. Ouvi dizer que é a peca mais valiosa do museu, uma vez que retrata com riqueza de detalhes a cerimônia muísca (tribo indígena colombiana) da coroacão do imperador, que acabou por gerar a cobica dos espanhóis, que ouviram falar desse jovem coberto de ouro em pó, que subia a bordo de uma jangada com seus sacerdotes, todos igualmente cobertos de ouro, e jogavam ao rio mais ouro e esmeraldas, antes de mergulhar e sair purificado, na margem, deixando ao rio, as oferendas preciosas. Tal relato gerou a lenda do El Dorado, que se espalhou por diversos locais da América do Sul e provocou a vinda de hordas de exploradores, atrás das famosas minas e cidades cobertas de ouro, que na verdade, não existiam. Os muíscas provavelmente obtinham esse ouro através de trocas, com os povos andinos. Seu uso era meramente cerimonial. Não possuía valor comercial alto, já que pela altitude elevada, os objetos mais cobicados eram as conchas marinhas.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O Amor nos Tempos do Cólera

"Florentino Ariza estremeceu: com efeito, e ela própria dissera, tinha o cheiro azedo da idade. No entanto, enquanto andava para seu camarote, abrindo caminho entre o labirinto de redes adormecidas, consolava-se com a idéia de que ele devia ter o mesmo cheiro, só que quatro anos mais velho, e que ela sem súvida o sentira com a mesma emocão. Era o cheiro dos fermentos humanos, que ele perebera nas amantes mais antigas, e que elas tnham sentido nele. A viúva de Nazareth, que não guardava nada para si, tinha dito a ele de modo mais cru:"Já temos cheiro de urubú." Cada um suportava o cheiro do outro, porque estavam à mão: meu cheiro contra o seu. Em compensacão, muitas vezes pensava no caso de América Vicuña, cujo cheiro de fraldas descartáveis despertava nele os instintos maternais, enquanto o inqietava a idéia de que ela não pudesse aguentar o seu: seu cheiro de velho verde." Nessa já consagrada obra, o autor nos relata a espera de cinquenta e três anos, sete meses e onze dias para a concretizacão dessa estória de amor comovente. Enquanto viaja pela beleza das primeiras descobertas, do amor á primeira vista, constrói seus personagens com uma humanidade desconcertante. Revolve seus pensamentos mais secretos, deixando-os desamparados. Mostra a fragilidade da vida, dos percalcos do envelhecer, mas sempre com uma mensagem de esperanca para o amor. Surpreende o leitor, na percepcão de que os sentimentos não acompanham a decrepitude física de seus personagens. Passada em Cartagena,deixa rastros pela rua das janelas, portais e pracas,que recentemente conheci. Relendo a obra de Garcia Marques, aos poucos vou assentando todas as lembrancas, como quem se despede, aos poucos, de um amigo muito querido. Infelizmente, o filme não lhe faz juz. Apesar de Javier Barden e da fabulosa Fernanda Montenegro, ficou muito longe da essência dos escritos. Para quem quiser conferir, o trailer: